A HUMILDADE NECESSÁRIA
Por Danilo Sili Borges
Em tempos bíblicos, aprendemos a fabricar tijolos muito
resistentes e com eles começamos a construir uma torre que seria tão alta para
alcançar o céu. Éramos um só povo e falávamos uma só língua, isso logo após o
Dilúvio. O grande empreendimento, símbolo da nossa grandeza, não prosperou.
Dividimo-nos em diversas nações e passamos a falar em variadas línguas. Nunca
mais nos entendemos.
O acelerado avanço científico e tecnológico das últimas
décadas deu à humanidade a certeza que os riscos que a sujeitavam advinham somente
do terrorismo e das guerras limitadas, provocadas por antigas questões étnicas
e religiosas, manipuladas por potências externas. Mesmo as grandes questões
comerciais e de poder global envolvendo os Estados Unidos, a China e a Europa
apresentam interesses de capitais e empresariais tão imbricados que as disputas
são perfunctórias, limitando-se a arroubos e nunca levando às vias de fato.
Ficando o restante do planeta na condição submissa de fornecedores de
commodities e de mercado consumidor. Aqueles que, como nós, compraram
globalização, estão recebendo globalismo. Poucos escaparam.
Mesmo os que têm por hábito e profissão perscrutar o futuro
– historiadores, filósofos, artistas, ao se aventurarem a pôr os olhos no porvir
observável não puderam ver perigos nos horizontes a navegar. Céus de
brigadeiro, para os aeronautas. Os poderosos telescópios não mostram colisões do
planeta com grandes corpos cósmicos. Aos menores, que também não aparecem nas
telas, ciência e tecnologia desenvolvem estudos para lhes alterar a rota
mediante a instalação de foguetes em suas superfícies. Tudo em gestação,
produzido pelo engenho humano.
Desconfio que a NASA e organizações similares andam a
procura de um planeta, plano B da Terra, se esta, por algum motivo, se tornar
inviável, quando leio a notícia de que se localizou, a não sei quantos
anos-luz, nesta ou noutra galáxia, um planeta, com tais características, que
nele possa frutificar a vida, como a conhecemos por aqui. Logo imagino que
cientistas estejam trabalhando em projeto que garanta a continuidade da
espécie, plantando num deles o nosso DNA e, se possível, um pacote com embriões
da nossa cultura.
Autores sérios, como o best seller Yuval Harari, com base em
atualizadas pesquisas científicas, previram substanciais modificações para o
mundo, ainda neste século, sendo uma delas a ampliação da duração da vida,
admitindo até a hipótese da imortalidade. E ainda a construção de homens
evoluídos, para muito além do possível pela teoria de Darwin, por via da
engenharia genética, verdadeiros super-homens, que dominariam o planeta,
auxiliados por máquinas, que, operando por algoritmos produzidos por
inteligência artificial, criariam um mundo de sonhos para parte da humanidade.
A outra, na visão dos futuristas, se constituiria de hordas de desempregados.
Céu na Terra para uns. Inferno para a maioria. Nesse aspecto nada tão diferente
do que já ocorre.
O percurso imaginado pelos futurólogos é cheio de percalços.
O script muda quase num instante e as melhores projeções vão para o brejo. A
natureza tem seus caprichos. E os interesses humanos também. Para uns, descuido num laboratório em Wuhan, para
outros, surda guerra biológica disparada, ou quem sabe, vingança da natureza
pelo muito que a machucam. E surge a praga que infecta o globo.
A dupla ciência-tecnologia tem se debruçado na busca da
vacina e de medicamentos e certamente irá conseguir. Mas que fique o alerta, os
vírus são altamente mutáveis, outros poderão surgir. O orgulho, a
autossuficiência, a inviolabilidade dos humanos não se justificam.
A hora crítica passará. Lideranças deverão orientar as populações na
mudança de valores para que percebam a fragilidade cósmica e telúrica sobre a
qual se assenta a civilização. O requisito para isso é abrirmos mão da empáfia
pelo que achávamos que éramos e nos enxergarmos como realmente somos. Ter
humildade é mais necessário que nunca.
Somos infinitésima parte do Universo em constante transformação.
Não temos nenhum controle sobre a maior parte do que nos afeta, ainda que a
ciência já tenha conseguido explicar muita coisa. Nem ela, nem a filosofia, nem
a religião responderam às questões mais básicas: quem criou isto tudo, para que.
Não há, portanto, nenhuma razão para nos sentirmos HomoDeus.
Assustados e
perplexos nunca tínhamos cogitado que para sobreviver será necessário dispor de
humildade existencial.
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili
Borges. Brasília – Mai.2020
TEXTO ALUSIVO AO DIA DAS MÃES PODE SER ENCONTRADO NO BLOG
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