APENAS NÚMEROS

Por Danilo Sili Borges


Números, por si mesmos, não dizem nada. Se eu disser 2022 ou 1179, sem nenhuma informação complementar, isso nada significa. Se na sua cabeça já existirem conhecimentos a respeito deles isso pode ser um dado para você.
Gente que fugiu da escola por causa da matemática, aumentando a evasão escolar, está ligando nos jornais da TV para ver a evolução dos números da pandemia com mais interesse que pelo resultado da mega sena. Para muitos, a vida tem mais valor que a riqueza e que a economia, sinal dos tempos.
Há místicos que procuram relações mágicas nos números, estetas que veem beleza em proporções entre valores, que ao se combinarem agradam os sentidos. É o caso do número áureo, que desde remota antiguidade comparece em obras de arte. No século XIII, Leonardo Fibonacci, talentoso matemático, nascido em Pisa, criou uma sequência de números, onde cada um é a soma dos dois antecedentes e que se comprovou descrever o crescimento de seres da natureza, ao que se deparou por observação, e pela qual também se chegou, por cálculo, ao número áureo. Coisas desse tipo levaram Platão a ser o filósofo entusiasta do saber matemático.
Afirma-se que a história da evolução dos números começou com a contagem, quando um pastor, para não perder suas ovelhas, fez corresponder a cada uma, uma pedrinha que colocava num bornal. De lá pra cá, as coisas mudaram muito: computadores, internamente, funcionam apenas com 0’s e 1’s, e mudaram, nos últimos 80 anos, a face deste ousado planeta.
Pode-se contar a História da Humanidade pelas histórias sobre os números, que, sem trocadilhos, são inúmeras. Os Romanos, cujo império dominou o mundo por séculos, tinham um sistema numérico que não conseguia expressar um conjunto vazio – não tinha o equivalente ao zero –, o que tornava muito difícil operar com ele. Os algarismos romanos, hoje, estão quase no museu. Os arábicos, com a sacada do zero, foram o fulcro para o grande desenvolvimento científico do saber humano.
Há pouco tempo, tive notícia da existência de tribo na Amazônia, de quase nenhum contato com os homens modernos, cujo sistema de contagem é: 1; 2; muitos. O que significa apenas que as situações existentes na sua sociedade não exigiu maior aprofundamento nesse particular. Afinal, “a necessidade é que faz o sapo pular”.
Vivemos no mundo da informação. Para a mídia só interessa os números alarmantes. Quando Itália e Espanha ostentavam recordes diários de infectados e mortos, eram notícias constantes e repetidas nos telejornais. Com os casos em queda, os países europeus perderam espaço nas TV’s. Informações numéricas recebidas da mídia devem ser comparadas com cuidado. Por exemplo, quando dizemos que no dia 19 de maio, última terça-feira, que o Brasil ultrapassou as mil mortes por covid-19 em 24 horas, na realidade 1179, e que ontem, 21 de  maio, nos Estados Unidos, os óbitos foram de 1255, devemos relativizar esses números para compreendê-los.
Em boa parte das vezes usamos simplesmente números para comparar essas situações. Comparar é medir. Para medir é preciso de um padrão confiável, aqui usamos o período de 24 horas, mas deixamos de levar em conta a base numérica sobre a qual se deu o número de mortos: no Brasil 210 milhões, nos Estados Unidos 360 milhões. Um índice que daria mais informações seria calcular o número de mortos por milhão de habitantes nas últimas 24 horas. Aí sim, poderíamos estabelecer melhor comparação.
Claro que esses índices não deixam perceber outras circunstâncias, como as condições de habitação, as sanitárias e a idade média das populações. Para captar outras condicionantes, novos índices devem ser criados.
 Tomei, para o Brasil, a data de 19 de maio, última terça-feira, por termos ultrapassado, então, mil mortes em 24 horas, o que, como vimos, é uma medida pela qual o Brasil está disparando e que você pode comemorar entre gargalhadas, sozinho ou com amigos, fazendo um vídeo de deboche, tomando cloriquina ou tubaína, dependendo, apenas, da cor da sua bandeira e do tamanho da sua estultice. Para esse caso a matemática tem o conceito de infinito.
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Mai. 2020
danilosiliborges@gmail.com

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