GARANTISMO TAMBÉM ÀS VÍTIMAS
Por Danilo Sili Borges
Sou
analfabeto em Direito, mas leio jornais e boas obras literárias, além de
acompanhar o cotidiano pelos noticiários das televisões. Minha atenção tem sido
atraída para o uso cada vez mais constante do termo “garantismo”, certamente
oriundo das ciências jurídicas, tão distantes da minha cartesiana formação de
engenheiro.
Num primeiro
entendimento leigo, pelo contexto, pareceu-me que o termo referia-se ao
impedimento da Justiça não poder utilizar instrumentos, além dos permitidos
expressamente nos códigos, para julgar acusados de determinados fatos
delituosos. Como entre meus leitores existem leigos como eu, permito-me
apresentar um exemplo chulo: para se alcançar a confissão de um suspeito,
digamos de roubo, assassinato ou de ação contra a segurança do Estado, não é
permitida a tortura, como se fazia na Idade Média ou mais recentemente nos regimes
de exceção. Procedimentos desse tipo
invalidariam, em tribunais republicanos, o correspondente processo.
O velho e bom Google está aí para
nos auxiliar, desde encontrar um meio de eliminar um incomodativo calo na sola
do pé, até a entender o que é ter uma boa noção do que significa “garantismo”.
Eis que encontro, como luva a procura de uma mão, o conceito de Garantismo Hiperbólico
Monocular, que, na minha simplicidade de entendimento da matéria, me leva a
concluir tratar-se de excessiva proteção à impunidade em detrimento à garantia
da vítima ou, dizendo de outro modo, em
contraposição ao conceito proporcional do Garantismo Integral.
Claro que essa não é a minha
praia. Sou da planície, apesar de viver há mais de meio século no planalto,
hoje temo os rumos que vejo o Planalto seguir.
Na malícia acumulada ao longo dos
meus 80 anos, comecei a perceber que o “garantismo” se articula por aqui com
atitudes tomadas no âmbito da política e da justiça de alto coturno com
objetivos não tão nobres quanto os pretendidos no âmbito dos Direitos Humanos.
Não é comum a Corte Suprema de um país propor ao legislativo que ele aprove lei
de determinada natureza, mormente se for para atingir direitos alheios; não é
comum que essa mesma corte altere seu entendimento, como alfaiate que faz um
terno sob medida, para livrar das grades um apenado, julgado por tribunais
legalmente constituídos. Não são comuns as interferências recíprocas entre
poderes, mostrando grave patologia institucional, que só encontra acordo quando
se trata de afrouxar as penas dos que guardam milhões em apartamentos ou os que
correm às noites pelas ruas com malas de dinheiro ou seus mandantes.
Garantismo Hiperbólico e Monocular
– muito grande e garantindo direitos somente ao réu – é o que pretendem e o que
se está promovendo para esses meliantes. Gente que vive no planalto, ou próxima
do Planalto, questão de gramática ou de geografia. Ou quem sabe, de moral.
O outro objetivo, tão torpe
quanto esse, é atingir jovens que, por concurso público, entraram para a
Justiça, para o MPF, para a PF, por competência, não eram do Planalto, nem filhos
deste, e ousaram ir fundo contra a roubalheira e a corrupção. Novos Tiradentes,
a exemplo do outro, pretendem sacrificá-los e expor suas partes estraçalhadas,
pelos postes das estradas que levam até a VilaRica de agora, a Brasília, para servir de exemplo aos que se põem contra
os que estão sempre no alto do planalto ou será Planalto? Questão de Gramática!
O Garantismo é Hiperbólico como o
que se pretende no Brasil, exagerado, e Monocular por nada garantir às vítimas
dos crimes. Nada contra um Garantismo Hiperbólico, grande que seja para
garantir todos os direitos dos que pagam tributos e que são sistematicamente
roubados, mas em lugar de monocular, como um Camões que deixou parte da visão
na guerra, por seu Portugal; binocular, para ver todos os recantos e descobrir
os que roubam hospitais inteiros, escolas completas, alimentos dos famintos,
segurança dos que são assassinados nas ruas e mais que tudo, a dignidade do
povo da planície.
O velho engenheiro lembra-se da antiga
canção que Lupicínio Rodrigues compôs e Linda Batista tão bem interpretou – Vingança
– na qual pontifica “que a vergonha foi a herança maior que meu pai me
deixou”.
Os pais dos senhores devem ser, ou terem sido, da minha geração, e
lhes terem deixado a mesma herança. Usem-na.
Crônicas da Madrugada.
Danilo Sili Borges. Brasília – Ago. 2020
danilosiliborges@gmail.com
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