CARTA A MARCELLO JOSÉ MOREIRA
Por Danilo Sili Borges
Marcello, estou aguardando os
originais do livro que você me solicitou que lesse, com curiosidade, confesso.
Primeiro, porque sei do seu
talento como escritor e do conhecimento que você tem como estudioso da história
da Igreja Católica, depois por você me ter dito que eu era o único agnóstico a
quem você entregaria aquela tarefa. Ganhei vaidade pela confiança e preocupação
pelo rótulo.
Trabalhos de pesquisa histórica
devem estar assentes no pressuposto da isenção, e quando conduzidos por um
aficionado, isso pode falhar. Não terá sido esse o caso da sua obra. Nos
conhecemos há décadas e desde então discutimos temas polêmicos, desses que
dizem não se deva discutir. Vem daí a admiração e o respeito que tenho pela
pessoa íntegra que você é, incapaz de transgredir uma única vez a ética natural
preexistente em todos nós, e que está acima das que se escrevem nos códigos. Conhecendo
o autor, como conheço, atesto preliminarmente a honestidade da obra. Espero
poder tê-la nas mãos brevemente.
Fiquei, como se dizia nos bons
tempos, “com a pulga atrás da orelha” pela classificação de agnóstico que me
foi imputada. Não que eu tenha algo em contrário ao agnosticismo ou aos seus
adeptos. Talvez, o mais próximo que eu possa estar disso seja o cartesianismo a
que me levou minha formação de engenheiro pela prática profissional de
exigências de comprovações e exatidões.
Não sou versado nas filosofias,
mas se a covid permitir, pretendo investir um pouco do meu, já escasso,
horizonte temporal nesses desafiantes conhecimentos.
Do lado mais soft da realidade em que se vive, tenho dúvidas, enquanto
religiosos e agnósticos têm certezas. Os primeiros têm fé nos seus deuses, nos
seus profetas, nos seus livros. Os agnósticos, no simples entendimento que
tenho, precisam de provas demonstradas para crerem.
É aí que me perco!
Caro amigo, Marcello, dentre as
datas que preservo indelevelmente na memória, está a de 8 de dezembro, que,
neste ano, foi na passada terça-feira. Em 1951, aos 10 anos recebi, nesse dia,
a 1ª Eucaristia. A data, como você sabe é dedicada a Imaculada Conceição. A
Comunhão inaugural daquela garotada foi em uma ensolarada manhã de sábado na
Igreja de NS da Conceição, na rua de mesmo nome, no centro de Niterói, cidade
onde passei o adorável primeiro terço da minha vida.
Vou lhe mostrar foto daquele dia.
Em uma, estou empacotado numa veste branca, própria para a ocasião, adquirida,
lembro-me bem, numa loja de roupas para meninos, chamada “O Príncipe” e que
tinha um slogan inesquecível: “O príncipe veste hoje o homem de amanhã”...e os
de depois de amanhã também.
Pois é, meu amigo, minhas questões
começaram justamente aí, nessa época.
Aulas de catecismo com professora
catequista, uma vez por semana, e apoio de um livrinho com perguntas e
respostas prontas, para nos porem em contato com coisas sérias e novas para
nós: vida eterna, Deus, criação do mundo, pecado original, paraíso, demônio, pecado,
inferno e purgatório, confissões e vai por aí. Para cada pergunta/resposta do
livrinho que deveria ser decorada eu queria saber mais. Jamais consegui
destravar a catequista e a moça sempre me dizia que a resposta estava no
livrinho Sabe-Tudo. Inconveniente, parei de perguntar, mas não de ter dúvidas.
Fiquei adulto e as dúvidas também.
Em busca de serenidade e de
compreender o mundo, andei por muitas sendas, li muitos livros, ouvi gurus, e
por fim descobri que ter fé ou não, é uma questão genética, alguns nascem com
essa, feliz, propensão, outros não a terão nunca.
Há um fato básico e
inquestionável: o Universo é real.
Sua origem e sua autoria – se
existirem – são absolutamente misteriosas. Ao longo dos milênios, a Filosofia
vem explicando muitas coisas, mas como se dizia quando os biquínis eram mais
comportados: “A Filosofia é como o biquíni, mostra tudo, menos o essencial!”.
Meu prezado Marcello, agnósticos
e religiosos têm sempre respostas, eu só tenho dúvidas.
Do seu admirador e amigo,
Danilo.
Crônicas da Madrugada.
Danilo Sili Borges. Brasília – Dez.2020
danilosiliborges@gmail.com
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