DEMOCRACIA É CONQUISTA

 Por Danilo Sili Borges

Há pouco mais de uma semana, declaração do Presidente da República levou os brasileiros a refletirem sobre o sentido de democracia, ao nos alertar que essa milenar organização político-administrativa é, entre nós, uma concessão que os militares fazem ao restante da sociedade, ao seu bel prazer.

Uma rápida visita ao Google nos levará a Atenas do século VI a.C. e aos problemas e conflitos para administrar aquela cidade-estado, onde somente os ricos e poderosos tinham e desfrutavam do poder político. Ao povão nada além de trabalho e ração magra. Ah! e também serviam como bucha de canhão para as guerras. Desculpe, naquela época ainda não havia canhões, mas guerras eram frequentes e lhes davam espadas, lanças, flechas e coisinhas do gênero para matarem-se uns aos outros.

A ida ao passado nos vai mostrar que a democracia surgiu com homens de pensamento naquela Grécia muito antiga, os filósofos que nos legaram as bases intelectuais da nossa civilização e que constavam, em essência, no que concerne à ciência política, de que os governos fossem escolhidos por meio de consultas públicas aos cidadãos. Alguns cargos, chamados magistraturas eram preenchidos por sorteio entre os interessados, função importante a dos “estrategos” (generais) era por eleição.

Verdade, verdade, é que nem todos os da comunidade eram cidadãos com direito a participação na escolha dos governantes. Excluíam-se as mulheres, os que não possuíssem propriedade, quem não tivesse nascido em Atenas de pais ateniense, os escravos capturados em guerras e vai por aí. De qualquer forma, já eram avanços no caminho para a desconcentração do poder.

Desde então, o direito universal para participar da grande e permanente festa da democracia tem caminhado como conquista milenar, lenta e sofrida, com avanços e recuos. Tem custado esforços, guerras, vidas. Nunca tem sido concessão ou doação.

O Brasil rompeu com o autoritarismo do período Vargas, ao término da 2ª Guerra, pela contradição de termos lutado ao lado das forças democráticas contra o nazifascismo e de estarmos mantendo internamente regime policialesco. A ruptura já pretendida pelo povo foi conquista da sociedade civil e de suas Forças Armadas.

Entre trancos e barrancos, podemos afirmar que vivemos em uma democracia, desde 1985, a partir das “Diretas Já”, movimento liderado pelo saudoso e então jovem deputado Dante de Oliveira, que levou ao recuo do regime de exceção instalado em 1964, diga-se de passagem, instalado para corrigir turbulência institucional que ameaçava concretamente a integridade nacional, naquela conturbada época. O desgaste do regime militar, que deixou notáveis índices de desenvolvimento, deveu-se à longa permanência no poder, com os inevitáveis desconfortos, vícios e abusos que daí decorrem em regimes autoritários.

Pondo os pingos nos is, o retorno ao regime democrático não foi concessão, mas conquista popular. Se a partir de então, os que assumiram a condução da nação não estiveram à altura dos seus encargos, isso é outra questão, mas não culpem por isso a democracia. Ruim não é o regime, é a qualidade da nossa representação política. Tanto isso é verdade que nestas poucas décadas de abertura franca tivemos dois presidentes da República impichados.

É hora de refletir, não sob ameaça de nos tomarem direitos legítimos, mas no intuito de melhorarmos o que somos e de irmos mais longe como sociedade organizada.

Democracia não é um regime político-administrativo que possa ser praticado com plenitude por uma sociedade constituída por cidadãos despreparados para assumirem suas responsabilidades. Do preparo individual é que se criam as habilidades para a prática coletiva. O grande coach (treinador) há de ser o governo, ou melhor, os governantes de todos os níveis, no trato com os cidadãos, pela verdade, pela honestidade, pela competência que pratiquem.

Dizendo de modo ainda mais específico, o movimento de soerguimento moral da confiança que conduz ao regime democrático deve começar sempre pelos mais elevados na hierarquia, dos mestres aos educandos, dos chefes aos subordinados, dos generais aos capitães, dos políticos aos eleitores, dos pais aos filhos, do homem público ao cidadão comum, formando uma rede de honestidade, patriotismo e verdade com malhas apertadas, que cubra todo o nosso território.

Quando qualquer parte desse grande tecido virtuoso se esgarça por não entender suas reais funções é necessário rapidamente corrigi-lo sob pena dele colocar em risco a trama do tecido democrático penosamente construído, ao longo de muitos anos, por dedicados e corajosos patriotas brasileiros.

O Brasil é sociedade homogênea de militares e civis e não está ocupado por tropas hostis ao seu povo. E que assim continue!

Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Jan. 2021

danilosiliborges@gmail.com

 

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