" O ANEL QUE TU ME DESTES ... "
Por Danilo Sili Borges
“...era vidro e se quebrou. O
amor que tu me tinhas era pouco e se acabou...por isso dona Chica, diga um
verso bem bonito, diga adeus e vá embora”.
Tal como nas celebrações sentimentais,
as alianças políticas também se partem, há perdas e derrotados. Ciranda Cirandinha,
o que cabe a dona Chica é ir embora. Com frequência alguns são recalcitrantes e
se recusam a entender que tudo acabou para eles, não dizem a quadrinha bem
humorada, nem escondem a lágrima do passado feliz. Aquele tempo acabou! E na
recusa, por vezes, se tornam violentos e na delegacia a questão é com a Maria
da Penha.
Mesmo de longe, e não fazendo
parte diretamente da questão do desenlace político que está ocorrendo nos
Estados Unidos, na arquibancada virtual em que se transformou nosso planetinha,
pedimos: Donald, diga o verso bem bonito e vá pra casa. Poupe seu grande país
desse vexame global e histórico.
Nos países em que a escolha do
governante se dá por sufrágio universal, a diferença de votos entre o que vai
governar e o que terá o encargo da oposição costuma ser pequena, a dialética é
da essência da democracia. Governo e oposição fazem parte de um mesmo jogo como
adversários e não como inimigos, que defendem teses, princípios e ideologias
políticas diferentes e que periodicamente se submetem ao escrutínio popular.
Radicalizações ideológicas, interesses
não confessáveis, perfis psicológicos com patologias graves podem levar a
situações de convívio político, insustentáveis, quando não são observadas as
regras do jogo civilizado da disputa democrática pelo direito, conferido pela
maioria, de orientar os rumos da sociedade.
Antes mesmo das eleições e
pressentindo a derrota anunciada pelas pesquisas, Trump dizia que seria vítima de
fraude eleitoral. Confirmada a vitória do concorrente dezenas de ações
judiciais foram interpostas pelo insatisfeito candidato e nenhuma delas
prosperou. Para a Justiça daquele país não foram encontrados indícios de desvios
da conduta eleitoral.
Teria sido a hora de ter aceitado
a derrota ou de ter apresentado provas incontestes de que as eleições tinham
sido irregulares. Momento certo de ter posto a ”viola no saco”.
Minha geração, que teve sua
formação política no pós segunda guerra, aprendeu a admirar os valores da
sociedade americana: a democracia, a liberdade de expressão, a justiça
igualitária, a livre iniciativa, dando lugar ao empreendedorismo que a enriqueceu.
Vimos também seus defeitos, como a intolerância racial, a economia predatória com
países menores, a arrogância imperial intervencionista. Sobrou grande saldo
positivo de admiração pela grande civilização do norte do continente.
Quarta-feira, 6/1/21, lamentamos
o dantesco espetáculo da invasão do Capitólio por turba enfurecida, para
impedir a confirmação do resultado das eleições, que o perdedor acusava de ter
sido fraudada. Emulados pelo Presidente Trump, o que se procurou foi instalar a
insegurança nas instituições do país, quebrar definitivamente o anel de vidro,
a aliança sobre a qual está assente a grandeza da nação americana, princípios estabelecidos
há mais de 200 anos pelos Pais Fundadores dos Estados Unidos. Crime de lesa-pátria
se não for provada a fraude eleitoral, como não foi.
Teorias conspiratórias têm sempre
adeptos. Acusam sem provar. Preparam no dia a dia guerra psicológica. Segundo
pesquisas, aproximadamente 1/3 dos eleitores americanos admitem que possa ter
havido fraude nas eleições, com isso rompe-se a confiança no sistema de governo
e a governabilidade do país.
Encontrará a sociedade americana
forças para restaurar seus valores?
O mundo espera que o governo Biden
consiga recuperar as tradições democráticas da sociedade americana. O ocorrido
na mais estável e antiga democracia do mundo não deve servir de exemplo a
tentativas similares, em países menos estáveis politicamente.
O sectarismo político implantado
no Brasil durante anos transformou adversários em inimigos. “Nós e Eles”, “Perigo
Chinês”, “um comunista atrás de cada árvore”, “uma boa bala e uma boa cova para
cada conservador” fazem o caldo de cultura em que engordam os extremistas das
ideologias, defendendo teses vencidas há décadas por todo o mundo; mas que por
aqui sobrevivem para afastar dos rinques das disputas democráticas os homens do
entendimento e das alianças para que o país encontre o meio termo do caminho do
entendimento.
O confronto
interessa aos radicais, aos que pregam o ódio e a intolerância como bandeiras
políticas. Anéis quebrados. Que por aqui dona Chica mude o tom, diga um verso
bem bonito e só permaneça, na verdade e na tradição dos construtores da Pátria,
pois também os temos, como o foram
Juscelino, na República e Pedro II, na monarquia.
Crônicas
da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Jan. 2021
danilosiliborges@gmail.com
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