TALENTOS E FUNÇÕES
Há
os que creem que ao nascermos nada trazemos gravado no nosso cérebro além do
necessário para o funcionamento da vida instintiva, automática e primitiva, e
que daí por diante tudo seria adquirido por ensino e aprendizagem. Claro que
nesse software mínimo, estaria uma parte que nos permitiria a interação com os
demais seres da natureza. Uma ideia igualitária, “politicamente correta”, tão
ao gosto da atualidade, mas que não se sustenta frente à prova da realidade.
Surge daí, por exemplo, o
esdrúxulo conceito da definição do gênero sexual como uma escolha consciente do
indivíduo, pela sua vontade e não por uma determinística ação da natureza na
disposição cromossômica e hormonal que se dá desde a concepção e ao longo da
vida intrauterina. Tentativas de explicação da natureza a partir de ideologias
políticas ou religiosas sempre dão errado.
Visão extrema, tão ao gosto das
tradições de povos do oriente médio, de onde tenho minhas raízes, é o fatalismo
do Maktub, de que tudo estava escrito, previsto. Até o fato do cair de uma
folha de uma árvore estava impresso no Livro da Vida. Obviamente é filosofia
paralisante e contrária ao crescimento de qualquer valor.
Outros nos ensinam seu mapa único
das virtudes e nos dizem: “Sigam-no se quiserem, vocês são livres para escolher,
mas lembrem-se da maçã, da cobra e da eva, se saírem do que está riscado, o gadanho
das três pontas vai pegar cada um”. Um horror!
A verdade é que a combinação,
provavelmente randômica, dos genes que nos compõem as células, e que a ciência vai
desvendando os mistérios com rapidez e positivas consequências, como agora, com
a criação das modernas vacinas que imunizam contra o SARS-CoV-2 pela tecnologia
do RNA mensageiro, é o mesmo caminho que vai comprovando pela ciência que cada um
de nós recebe conjunto de talentos próprios para serem usados na sobrevivência,
desenvolvimento próprio e contribuição ao meio ambiente e social.
E o quanto antes percebermos quais
são os nossos talentos, tanto mais cedo seremos úteis e estaremos adaptados ao
meio em que nos desempenharemos harmoniosamente, no modo que se convencionou
chamar “felicidade”.
Tentar forçar a barra para ir
além das melhores capacitações naturais não costuma permitir voos de longa
distância. Vamos a um hipotético exemplo extremo: imagino que por mais que Pelé
tivesse se dedicado ao estudo da Física, dando a essa ciência toda a sua
inteligência e comprovada capacidade, nunca teria chegado a um Nobel, como também
intuo que Einstein mesmo que dedicasse centenas de milhares de horas de treino
na sua juventude ao futebol, jamais levantaria a taça da Copa do Mundo. Questão
de talentos.
Como sabemos se alguém está
fazendo uso pleno de suas capacitações inatas nas tarefas que executa? Observe-o:
Quem está operando dentro de seus atributos durante o trabalho, é feliz. Mostra
proficiência, o rendimento e a qualidade do seu trabalho são apreciáveis. A
curiosidade, as horas de estudo, a preparação física, por exemplo, no caso de
atletas, não lhes representa sacrifícios, mesmo que os estafem, nunca perdem o
bom-humor.
E quem está fora do diapasão,
quais são os sintomas? Está sempre infeliz, é agressivo, o resultado do seu
trabalho é ruim, repassa a culpa dos seus erros a outros. Sofre com o êxito
alheio como se fosse um insucesso seu, teme a concorrência. É um desastre.
Sempre que tiver que chamar
alguém para o seu time, faça como o Jorge Jesus: se é de um centroavante
matador que precisa, não coloque na posição um zagueiro ou um ala. Talentos não
se improvisam.
A pessoa certa, no lugar certo
nunca perde as estribeiras. Churchill tocou uma guerra, vendo a Inglaterra ser
bombardeada várias vezes ao dia e manteve a elegância e dele o povo não ouviu impropérios
ou manifestações de primarismo.
João Nogueira de Rezende,
deputado federal por Minas Gerais em oito mandatos, nosso saudoso companheiro no
Rotary Club de Brasília Lago Sul, trazia-nos fatos da sua vivência nas lides
políticas, com os quais nos brindava após o término das reuniões do clube. Recordo-me
da sua admiração de como o presidente Juscelino era capaz de conduzir tantas e
tão complexas tarefas do seu Plano de Metas, transmitindo otimismo e
sentimentos positivos. Anote-se que Rezende, na política, sempre esteve em
oposição a JK.
Lembro-me e vou reproduzir o que
ouvi do experimentado político: “Eram sempre encontros agradáveis, mesmo sendo
eu do bloco da oposição e estando Juscelino sob fogo cruzado dos competentes
Carlos Lacerda, Afonso Arinos, Temístocles Cavalcanti. Ele nunca deixou de
receber individualmente nas manhãs das quintas-feiras no Catete parlamentares
da situação e da oposição para resolver pendências. Essas reuniões se iniciavam
sempre com um pedágio, o visitante deveria trazer um “causo” ou uma piada nova
para lhe contar e rirem juntos, enquanto tomam o café que abriria a conversa”.
Êta, Brasil
feliz!
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili
Borges. Brasília – Mar. 2021
danilosiliborges@gmail.com
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