QUESTÕES DE BOM SENSO

 Por Danilo Sili Borges

Se for feita uma pesquisa, 100% dos entrevistados dirão que têm bom senso no cuidar de todas as questões que lhes cabem tratar, tanto no âmbito de suas atividades profissionais, quanto nas que se refiram às demais. Assim também é o cronista que assume posições frente a questões que brotam no cotidiano e que impactam a vida comunitária. A este cabe, no entanto, não apenas formar opiniões, mas embasá-las com lógica, para torná-las disponíveis à discussão, ao embate de ideias ao divulgá-las.

Neste texto trato de duas questões que pipocaram com força na mídia nos últimos dias, uma em âmbito mundial – a sugestão do governo americano de quebrar as patentes das vacinas contra o vírus da Covid-19 e a outra, de consumo interno, as passeatas com expressivo número de participantes, pressionando pela ruptura do processo democrático existente no país. Vamos, por partes, e usando o bom senso, que achamos que temos, cuidar de cada uma.

De repente, o governo americano divulgou a disposição de suspender as patentes das vacinas contra o vírus SARS-CoV-2 algo, em princípio impensável, vindo de um governo da catedral do capitalismo, que traz o direito à propriedade intelectual, incluindo-se aí a inovação tecnológica, como um de seus dogmas. O que se justifica pelos altos investimentos que são feitos na atividade.  Surgiram reações do setor farmacêutico, das indústrias de ponta e da política conservadora, incapaz de sopesar vantagens entre social e capital.

O que teria levado o governo americano à proposta arrojada, já que o país caminha para a cobertura integral da sua população vacinável? A resposta é simples. O elevado poder de contágio da doença não garante segurança a ninguém, enquanto a pandemia não estiver contida em todo o planeta, inclusive para evitar o surgimento de variantes de controle muito difícil. Há que se considerar também que a econômica concentradora de riqueza, há muito adotada nos Estados Unidos, abriu flancos para a política de cunho mais social pregada pelo Partido Democrata.

O setor farmacêutico, dos mais rentáveis da economia mundial, desenvolve pesquisas caras que demandam altos investimentos e que se ressarce pela venda dos produtos e serviços garantidos por patentes, com altíssimas margens de lucro. Isso é do jogo do capital, que se não é dos mais amigáveis, se olhado do ponto de vista humanitário, é o mais eficiente e o que atende às necessidades das pessoas com qualidade e prontidão.

A discussão está na mídia, nos fóruns, nas organizações internacionais. Não se questiona a necessidade da vacinação rápida e total da população mundial, e de dar continuidade a procura de vacinas mais eficazes e de tratamentos pós-infecção. As pesquisas são caras e a pergunta é quem vai pagar a conta?

Na questão atual da suspensão temporária das patentes para que a fabricação de vacinas possa se dar por todo o mundo, Biden sente-se confortável, o governo do Estados Unidos investiu pesadamente no desenvolvimento do produto, transferindo consideráveis recursos a laboratórios de pesquisas das farmacêuticas, ainda em período anterior ao seu.

De qualquer modo, as pesquisas sobre esta pandemia e de outras, que especialistas julgam prováveis, vão continuar, e devem ser encontrados meios de financiá-las, para não sermos apanhados de calças curtas.

Vamos agora analisar o intramuros:

A questão doméstica que vamos ver é intermitente, com recorrência de umas poucas décadas, mascarada de ideológica, é na realidade político-eleitoral. A componente ideológica presente restringe-se às pontas dos espectros da direita e da esquerda radicais numericamente inexpressíveis. As lideranças oportunistas são pouco versadas no que discutem. Simulam e fantasiam sobre o que desconhecem nos obrigando a ouvir discussões e disputas que o mundo superou ao cair o muro de Berlim e a China ao esquecer de Mao.

As rupturas institucionais, como agora estão sendo abertamente pregadas, não constroem nada. Elas na realidade atrasam o aprendizado democrático pelo tempo que duram e muito mais, pois extirpam lideranças e aniquilam outras, nascentes.

Povo na rua, com os motivos de agora, é sinônimo de alienação política. As manifestações deveriam, sim, se necessárias, pedir justiça honesta, punição para ladrões, eleições limpas, regulares, com candidatos insuspeitos, esta seria a manifestação democrática por excelência e nunca berrar por governos de exceção.

O processo da construção da Democracia é lento, mas tentar encurtá-lo, conduz a grandes dores, a atrasos no processo político-civilizatório, além de derramamento de sangue, para atender somente a desejos e vaidades de mando e poder autoritário.

A longo prazo a consolidação da democracia está nas escolas, com a bandeira verde-amarelo no mastro, em quantidade e de boa qualidade, livres para formar cidadãos críticos, socialmente comprometidos, laicas para que os jovens possam escolher religiões se, e quando, quiserem, e tão laicas que não haja o risco de pretenderem induzir os jovens a professar precocemente as modernas religiões, com seus dogmas ideológicos, que no século passado vitimaram milhões de pessoas, o nazifascismo e o comunismo.

Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Mai. 2021

danilosiliborges@gmail.com

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