O BLOCO DO LIBERA GERAL
País tropical, o Brasil esteve
desde os primórdios de sua colonização sujeito a ter que lidar com endemias de
causas diversas, principalmente de origem hídrica. O Rio de Janeiro, sua
capital desde 1763, era evitado por visitantes por ser considerado cidade
doentia. Com o surgimento das vacinas e as maciças campanhas públicas de
vacinação no final do século 19, a situação se foi alterando. A salubridade da
região se completou com o saneamento da Baixada Fluminense nos anos 30 do
século passado, que erradicou diversas viroses transmitidas por mosquitos.
Nas campanhas pela saúde pública,
notabilizou-se o médico Dr. Oswaldo Cruz – que dá nome ao conceituado Instituto
Fiocruz, do Rio de Janeiro. Mais que ninguém, sabedor do poder de contágio das
doenças, com o aval do Presidente Rodrigues Alves, o médico implantou a
vacinação contra a varíola, em caráter obrigatório, o que gerou forte reação na
população. Instalou-se o que ficou conhecido como a Guerra da Vacina, na qual
Oswaldo Cruz – e o governo – foi vencido. O tomar ou não vacinas era decisão
voluntária e estava decidido. Data, 1904.
Os problemas são recorrentes.
Esta semana, o Dr. Oswaldo Cruz, 117 depois, outra vez, perdeu a Guerra da Vacina,
agora para o Ministro Onyx Lorenzoni, que baixou a Portaria MTP 620, de 1º de
novembro, que não permite às empresas exigirem dos empregados sua vacinação
contra a Covid.
A vacina confere proteção não
apenas ao indivíduo isoladamente, mas principalmente à comunidade à qual ele
frequenta, daí a necessidade de sua obrigatoriedade. É por isso que não pode
ser uma decisão pessoal vacinar-se para estar no ambiente de trabalho. Garantida
a liberdade individual, põe-se em risco todos os outros colegas do que não quer
se vacinar. O limite de toda liberdade é o direito do próximo. Neste caso, o
direito à vida.
Um exemplo simples pode
esclarecer: Suponha que seu vizinho do apartamento do andar superior resolva guardar
500 litros de gasolina em seu apartamento para se proteger dos atuais aumentos
frequentes. É óbvio que isto põe em risco todo o bloco e essa situação deverá
ser levada às autoridades pelo síndico e proibida. O processo civilizatório
acaba por alcançar até os mais recalcitrantes. Pode levar tempo, causar dores e
mortes, porém acaba por se impor.
Com o passar dos anos a vitória foi
da civilização, muitas doenças estão controladas. A varíola completamente
erradicada, a poliomielite com as vacinas Sabin e Salk, em vias de erradicação,
com notável contribuição do Rotary International. O ponto alto na Saúde Pública
brasileira é seu sistema de vacinação, que mostrou neste episódio da Covid-19
toda sua competência. Nesta data, 56% dos brasileiros estão imunizados com
vacinação completa, um outro parâmetro numérico, no entanto, preocupa e deve
merecer atenção.
A Taxa de Transmissão (Rt) mede a
capacidade de contágio na população. O Imperial College de Londres faz
sistematicamente essa medição a partir dos dados oficiais do país. Na semana
passada, o valor para o Brasil era de 0,68, isto é, cada 100 contaminados,
transmitiam o vírus para 68 novos infectados, podendo-se inferir o decréscimo
da pandemia. Nesta semana, o índice passou a 1,04, sinalizando 104 novos
doentes para cada 100 infectados, portanto, pandemia em alta, entre nós.
A primeira constatação que faço é
a rápida alteração deste índice. A liberação do uso das máscaras em locais
abertos, como que sinalizou o fim da pandemia, o que é reforçado pela liberação
do número de torcedores nos estádios de futebol e em outras manifestações
públicas. Aglomerações ainda que em locais abertos são fontes de contaminação.
Notícias recentes dão conta do
aumento de casos em países europeus nos quais medidas de proteção tinham sido
abrandadas, tendo em vista bons resultados dos processos de vacinação, que os
fazem pensar em voltar a eles.
A sensação de liberdade, do “já
passou”, que vai tomando conta de todos nós pode ser perigosa. Começam agora as
comemorações de fim de ano, na escola, no trabalho, na família. Logo estaremos
envolvidos com as promoções carnavalescas depois de um ano em que foliões
mantiveram presos na garganta seus gritos, requebros e pandeiros guardados. Temo
que os cuidados sejam esquecidos e que venhamos a ter uma recidiva do mal.
Forte campanha de esclarecimento
deve ser desencadeada pela mídia para que se evite um retrocesso.
Crônicas da Madrugada. Danilo
Sili Borges. Brasília – Nov.2021
O autor é membro da Academia
Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA
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