EU, MEDITANTE

 



Um fato irrelevante irritou-me hoje pela manhã, além do razoável, reconheço. “Devo estar ficando mesmo desses velhos ranzinzas que reclamam de tudo, uns chatos, logo eu, que cultivo com tanto empenho a tolerância e a compreensão”. Pensei, num exercício de amarga autocensura.

Julho, 4, 1978, tornei-me meditante, após treinamento singelo, em cerimônia de Meditação Transcendental ao receber meu mantra, que daí em diante não deveria ser pronunciado e apenas repetido mentalmente. Guardei a data por sua significação histórica: o Independence Day americano, 1776, que iniciou uma era de democratização no mundo, sendo logo seguida pela Queda da Bastilha, em 1789, e que dá frutos até hoje, apesar das muitas ameaças totalitárias, religiosas algumas, ideológicas outras.

Quanto à meditação, milhões de pessoas participaram daquele movimento, visto na época como contracultural, trazido ao ocidente, da Índia, principalmente nas universidades e no meio artístico. Hoje existem dezenas de sistemas de meditação com práticas variadas e que buscam igualmente a serenidade e a calma das pessoas. Estudos científicos comprovam resultados e médicos recomendam a meditação como uma prática salutar.

Os resultados da prática meditativa são cumulativos e ao longo da caminhada os praticantes os sentem como modificações lentas em suas reações em relação aos estímulos externos, não como resultado de uma procura consciente, mas como uma consequência, por isso, talvez o termo “cultivo” não tenha sido o mais bem aplicado no primeiro parágrafo deste texto.

Da maneira em que aqui chegou, a Meditação não tinha conotação religiosa e assim continua. Existem, no entanto, movimentos religiosos, que desenvolveram e trouxeram de seus mosteiros sistemas de introspecção que são hoje disponibilizados aos seus seguidores, com as mesmas vantagens e características dos pioneiros. A bem dizer, as orações com seus dizeres repetidos, mentais ou orais, individuais, coletivos, com ou sem músicas funcionam como os mantras cuja finalidade é o afastamento da mente das turbulências superficiais que perturbam seu aprofundamento em direção ao todo Universal, tenha ele o nome que cada um queira lhe dar. Essa é a essência da Meditação como a encontrei no meu caminho, outras certamente existem.

Medito com regular frequência, não em busca da santidade, mas da serenidade que pretendo ver surgir em mim. Na medida em que compreendendo que sou um simples ser do Universo, me dá a mesma segurança que têm os pássaros no seu voo, mas nenhum direito exclusivo, como aqueles que buscamos nos templos.

Ao me perceber como ínfima parte do Todo Universal, não pretendo privilégios e aceito as regras deste grande jogo. O que me cabe agora é entendê-las. Entendê-las, se possível codificá-las, com a finitude da minha compreensão, do meu cérebro.

A mente prenha de preocupações, de medos, de preconceitos, de angústias pelo porvir torna-nos incapazes de processar com eficiência as relações que se devem estabelecer naturalmente entre o todo e o indivíduo. E elas são de duas naturezas: uma intuitiva, sensível, involuntária e a outra intelectual, aprendida pelo treinamento e prática consciente, voluntária.

Eu me arriscaria a dizer que todo conhecimento humano, numa primeira fase, surge como intuição e depois evolui como desenvolvimento intelectual, de alguma forma codificável de modo que os fenômenos possam ser observáveis, previsíveis, manipuláveis, repetidos.

Também na prática diária o conhecimento sereno de como funcionam as pessoas – cônjuges, filhos, colegas, chefes – e objetos, mecanismos, máquinas, leis e códigos, normas são vantagens comparativas no jogo da vida.

Inteligente é o que consegue conhecer e aplicar o maior número de jogos em sua área.

Sábio é o que consegue conhecer e aplicar um grande número de jogos em muitas áreas.

Einstein, o grande cientista do século XX, judeu e religioso, declarou que seu grande desejo era conhecer o pensamento de Deus. Era a busca do conhecimento pela intuição para transformá-lo em teoria, comprovável cientificamente, como ele já havia feito, em alguns escaninhos do Universo.

A meditação é apenas um caminho.

Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Jul.2022

danilosiliborges@gmail.com

O autor é membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA

Comentários

  1. Desconhecia q Einstein buscava conhecer o pensamento de Deus - busco isto de forma obsessiva. Quais Seu objetivo e por que? Excelente como sempre Danilo, seu texto - temos muito em comum. ABS. Ronaldo carneiro

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