GILBERTO GIL E NEYMAR, OS CRAQUES
Afirmar, com jeito cândido de
quem só quer o melhor, que a seleção precisa livrar-se da “neymardependência”,
não esconde a divergência político-eleitoral dessa parte dos torcedores com o
jogador. Infelizmente esse não é um fato isolado e representa o triste momento
que vivemos nas práticas políticas do país.
Com a infeliz contusão do atleta
na primeira partida da Copa, surgiram na imprensa especializada chuvas de
opiniões calcadas no desejo de que poderemos chegar ao título sem a
participação de Neymar. O que fez de tão errado o protagonista atual do nosso
futebol para receber até mesmo de personalidades de importância na política
nacional tantas manifestações de repúdio? Desculpem-me o termo, mas o
sentimento expresso, que instilam em suas falas, é de ódio. Muitos, deixando
escapar, a boca-pequena, o desejo de que ele não se recupere para que não
receba os louros da vitória, mesmo que isso nos coloque mais distantes da taça.
Brasileiros, que têm caixa para
os custos e disponibilidades pessoais, foram ao Catar torcer e aproveitar as
emoções de um dos maiores eventos esportivos mundiais, somente comparável às
Olimpíadas. Dentre eles está outro artista – este a que me refiro, não é do
futebol – mas, considerado como um craque da música, da composição, da poesia,
da voz e que tem sabido nos encantar, e ao mundo, por décadas e que foi
atingido por ofensas por brasileiros, lá mesmo no estádio e nas ruas do Catar.
O que fez Gilberto Gil de tão errado para receber manifestações de ódio, por
brasileiros que deveriam o estar saudando ao encontrá-lo, acompanhado da sua esposa
Flora, em solo estrangeiro, torcendo pela mesma camisa verde-amarelo?
Gil, Neymar, você, eu, os seus e
os meus filhos e todos os seres humanos temos o direito de expressar livremente
nossas opiniões, preferências, umas contrárias às outras, pelo que quer que
seja, inclusive por opções políticas, e não podemos ser desrespeitados por
isso. O verdadeiro valor a ser preservado é a Liberdade, o direito a livre
expressão do pensamento, base da grande conquista da civilização, a Democracia.
O que se está assistindo é barbárie da pior espécie!
As situações lamentáveis, como as
aqui elencadas, não são episódicas no país. Todos de algum modo já a sofremos,
na universidade, no trabalho, na família. Elas são a consequência do plantio e cultivo esmerado da intolerância feitos
por radicais políticos na consciência do nosso povo por décadas.
“Nós e Eles”, “Nós contra Eles”.
Nós os do Bem, eles os do Mal. Pregação por um mundo bicolor, adeus às sete
cores do Arco Iris e às incontáveis possibilidades dos arranjos da inteligência
para criar soluções e vencer os desafios. Tal como no passado, só nós temos a
verdade, só nosso deus é o Deus.
A cada ação uma reação. E
chegamos aonde estamos.
Somos todos vítimas ou algozes da
estupidez do patrulhamento ideológico, mesmo nós, os cidadãos comuns. Quando os
atingidos são protagonistas, como Neymar e Gilberto Gil, tomamos conhecimento dessas
agressões violentas ou disfarçadas. E o pior, dependendo da nossa posição de
“nós” ou de “eles” em relação a cada um dos atingidos, covardemente concordamos
ou repudiamos o fato, num comportamento hipócrita que nos negamos a enxergar.
Avaliemos nossos ídolos pelas
obras produzidas por seus talentos específicos: esporte, arte, literatura,
ciência. Paremos, e por um minuto, pensemos no sentimento do músico,
compositor, cantor, poeta ao ser desfeiteado publicamente pelos seus patrícios.
Quanta decepção ele deve ter sentido! Ele, cujas composições e voz entram e
levam o prazer e o Brasil por todo os recantos do mundo. Seu erro? Pensar diferente
dos que lhe insultam, ter se posicionado por um candidato nas eleições que não
agrada aos que os agridem.
E Neymar? Terá ele o direito de
escolher, sempre que quiser, os seus candidatos nas eleições e poderá abrir o
seu voto, com o nome de quem lhe pareça melhor, apoiando publicamente o da sua
preferência, sem que lhe caia o céu sobre a cabeça, tal como é de direito ao
artista baiano escolher o seu e a todos nós fazermos o mesmo?
“Bom senso e canja de galinha não
fazem mal a ninguém”.
Crônicas da Madrugada. Danilo
Sili Borges. Brasília – Dez. 2022
O autor é membro da
Academia Rotária de Letras do DF.ABROL BRASÍLIA.
Perfeito. Respeito ao talento independente de posturas políticas. Abs
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