UMA LEITURA PARA 2020
Por Danilo Sili Borges
Esta crônica nasceu de conversa
recente que mantivemos, meu amigo Aluisio Oliveira e eu, sobre as discussões quanto
às vacinas contra o contágio pelo SARS-Cov-2 e o temor de parte da população em
utilizá-las. Da longa prática nas UTIs, às salas de cirurgia e de décadas observando
as reações das pessoas, seus temores em situações críticas e de acompanhar os
avanços das técnicas, dos medicamentos, dos tratamentos, vivenciei com o Dr.
Aluisio “uma visão de dentro”. Fomos além e elucubramos, como cidadãos do mundo,
sobre o presente e o porvir. Nem sempre estivemos de acordo, mas ganhei o tema
desta crônica: Como avaliar este ano confrontando-o com o de outras catástrofes
enfrentadas pela sociedade humana.
Até mesmo na conta das crendices
se colocam as dificuldades que estamos atravessando com a pandemia. “Ano
bissexto, e com essa repetição 20 e outro 20, dava pra adivinhar, não vejo a
hora dessa urucubaca acabar”.
Este ano, mais que qualquer outro,
trouxe globalmente à humanidade sofrimentos e mortes. As chamadas guerras
mundiais, mesmo assim denominadas, não tiveram caráter planetário. As agressões
ambientais são crescentes, mas não críticas, e cujos danos concretos são ainda pontuais.
Ao não ter na prateleira soluções
definitivas para a Covid-19, acompanhamos angustiados os cientistas afinarem
suas armas numa corrida de velocidade recorde que nos tem sido relatada pela
mídia mundo afora. A ansiedade predomina sobre o futuro.
Buscamos culpados nos mercados de
Wuhan. Da nossa impotência criamos teorias conspiratórias. Por sempre nos termos achado senhores da
Natureza, hoje trememos de medo e lembramos Einstein: “A Natureza quando
agredida não se defende, ela se vinga”.
Final de ano, é chegada a hora de
um balanço. Haverá algo de positivo que se possa garimpar nos destroços que vão
sendo deixados pelo vírus? Não se pretende adotar atitude de Poliana, pelo
contrário, com os olhos nos exemplos dos grandes traumas do passado, visaremos
intuir o que se pode esperar nos próximos tempos a partir dos esforços que a
humanidade está fazendo para superar o momento atual.
A resposta aos grandes conflitos
do século passado foi a criação de organismos supranacionais que zelam pelo
entendimento e pela paz, por mais justas relações comerciais, por princípios
éticos, que deram lugar a proposições como a Declaração dos Direitos do Homem. Avanços.
Claro que o mundo talvez não seja ainda o lugar que escolheríamos para viver se
pudéssemos escolher, mas lembre-se, já não temos tribunais de inquisição, a
intolerância religiosa está em baixa. O Papa lidera a integração religiosa e
chama a todos para se reunirem em torno de um Deus único. Deus já não tem
donos.
Espera-se que extremistas
religiosos e ideológicos se vejam excluídos do contexto global e nacional, para
que a paz prospere no entendimento inteligente.
Nunca a História havia registrado
catástrofe que tivesse atingido globalmente o Planeta. As situações mais agudas
foram as guerras mundiais, a bomba atômica, os desastres com usinas nucleares, sendo
Chernobyl o exemplo marcante, algumas pandemias como a gripe espanhola, além
dos desastres naturais: terremotos, tsunamis.
Nessas ocasiões críticas os
talentos exacerbam e produzem soluções que garantem a supremacia do homo
sapiens. Exemplo dessa superação foi ter Arquimedes, com espelhos,
concentrado luz solar e posto fogo na esquadra romana que sitiava Siracusa em
212 a.C.
As grandes guerras levaram a
desenvolvimentos de medicamentos como antibióticos, sulfas, anestésicos, técnicas
e equipamentos. Na tecnologia o motor a jato e o radar foram desenvolvidos no
esforço bélico, além do domínio da energia nuclear.
Das vacinas que hoje estão sendo
desenvolvidas, algumas têm tecnologias inovadoras, utilizando engenharia
genética, o que preocupa e atemoriza a muitos. Também foi assim com outros
avanços do conhecimento. A técnica, que na fabricação de vacinas, usa o mRNA,
para inativar a ação do vírus ao nível celular, está sendo usada pela primeira
vez e poderá ser a abertura para que outras doenças de origem viral venham a
ter vacinas como a AIDS, o Herpes, certos tipos de câncer.
Como espécie, aprendemos a
sobreviver por sermos gregários. Em grupos nos organizamos para a defesa, desde
a caverna, até as forças militares nacionais, mas pela primeira vez a ameaça é
global, de uma só vez a todos e a nossa sobrevivência e temos que reagir globalmente,
uma lição a ser aprendida.
A experiência que a Covid-19 nos está
impondo é altamente transformadora, as almas crescem pela introspecção a que
são submetidas e não voltam a caber nas ideias que as continham, e é assim que
a humanidade evolui.
A aventura
humana é cheia de riscos, mas tem valido a pena enfrentá-los.
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili
Borges. Brasília. Dez – 2020
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