NA RAMPA DA REITORIA

 



Instituições públicas devem ter seus procedimentos límpidos e cristalinos como água de fonte. A Constituição de 1988 consagra expressamente como princípios basilares da Administração Pública a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Não é hábito deste cronista trazer no escrito semanal situações, queixas ou reivindicações suas. A independência para avaliar e criticar é o nosso Norte. Se o faço hoje, tenho duas razões: a primeira é que os prejuízos que me estão sendo infligidos atingem também a mais de 240 aposentados da Universidade de Brasília. Segundo, não é lícito ou razoável a manipulação de procedimentos administrativos para inculpar outros órgãos ou o próprio governo da República, e isso ocorre largamente hoje no país.

Recebi a desanimadora informação na rampa da Reitoria da Universidade de Brasília, onde fui procurar saber sobre os cortes que venho sofrendo nos meus vencimentos de aposentado há alguns meses consecutivos, sem nenhuma explicação ou justificativa. Eu já estava de descida após não ter tido êxito na tentativa. O órgão que atende os aposentados não teve expediente, aquela tarde, por causa da pandemia. Um servidor penalizado, que subia, ao ver o claudicante idoso, inquiriu-me sobre o que procurava naquele prédio quase vazio. Expliquei. E recebi a desanimadora informação: “A Universidade não consegue nada no governo, esquece. Enquanto Bolsonaro não cair vocês não vão receber, sem chance, professor”.

A rampa é como os famosos corredores dos ministérios, por onde circulam boatos e se divulgam fakenews, a câmara de eco da instituição.

Anteriormente a essa arriscada excursão (tive que contrariar recomendação médica), eu já havia buscado saber da situação por ligação telefônica à Associação dos Aposentados da qual sou associado e descobri que de lá três dezenas de outros servidores estavam em situação similar, além de centenas de outros, com outras filiações.

Garimpando por vestígios do que poderia ter acontecido fiquei sabendo que o governo está promovendo recadastramento dos aposentados do executivo para que esses sejam administrados pelo INSS, o que será uma catástrofe para os aposentados, para os atuais segurados do Instituto e para o governo, tema de futura crônica.

Para o recadastramento foi dado um tempo longo para que os diversos órgãos do Executivo mandassem a documentação exigida. A UnB, por informações que obtive quinta-feira, 11, na reunião promovida pela nossa Associação, não cumpriu, em tempo, o determinado, origem do problema que estamos vivenciando. Rubricas cortadas dos contracheques sem aviso.

O que faz o Ministério da Economia ao receber os processos retardatários dos aposentados? Pasmem! Não sabemos! Há os que afirmam que amanuenses reveem as decisões já julgadas em caráter definitivo pela Justiça Federal, muitas delas há duas ou três décadas. Teríamos então o caso de as decisões judiciais serem revistas no escuro, uma lástima, talvez por isso tanto sigilo. Transparência, para quê? Hipóteses apenas. Sem publicidade, vicejam boatos e insegurança.

Pedro Malan, um antigo Ministro da Economia, disse uma verdade, ministros da economia não dizem muitas, convém guardar as que se comprovam: “No Brasil até o passado é incerto”. Direitos consagrados há décadas pelos tribunais são postos em dúvida, vencimentos são cortados sem respeito às necessidades de cidadãos e tudo se faz sem atenção a códigos e direitos adquiridos. E sem atendimento aos princípios basilares da administração pública. Que não tenha sido assim, mas por que tanto sigilo?

Esta situação caminhou ao insustentável até para velhos alquebrados pelo tempo e para pensionistas solitários, todos no poente da vida, até que resolveram pressionar à sua associação, a APOSFUB, por uma reunião em que ela trouxesse cabais esclarecimentos do passado – do porquê disso tudo; do presente, de como está a situação e das perspectivas de solução, isto é, de quando voltaremos a ter nossos contracheques sem restrições impostas, além das que a Justiça um dia entendeu como legais.

Em nome da Associação, coube ao seu advogado conduzir a reunião e dar os esclarecimentos que ele certamente buscou, no cipoal fechado da desinformação que cerca o tema há mais de meio ano. A pandemia justifica muitas boiadas. Assim ficamos sabendo que os processos para serem reimplantados nas folhas de pagamentos já estão na UnB há pelo menos dois meses, “mas que o assunto não é considerado de prioridade”. Levantaram-se às hipóteses de haver boicote por razões políticas entre governo e universidade, daí a observação do servidor da rampa.

Outra hipótese, esta aventada durante a reunião, que talvez já tenha circulado na rampa, argumenta que os responsáveis pela reimplantação dos direitos suprimidos não o fazem por entenderem que com aqueles valores os aposentados passam a ter vencimentos muito elevados. Tenho a reunião gravada para comprovar. Isso é verdadeiro? Boato? Fake? A falta de transparência não indica boas intenções.

Decisões judiciais novas ou antigas cumprem-se. Processos administrativos implantam-se com celeridade. Recusas e retardos podem ser entendidos como desídia, prevaricação e como tal os agentes faltosos são responsabilizados. Política não se faz contra ou a favor de instituições, porque o prejuízo é da sociedade e dos servidores.

Na rampa corre a conversa de que alguns já tiveram seus direitos restabelecidos, questão de sorte ou de ter “estrela”... política. É preciso averiguar se tem havido, também, falta de isonomia.

Dignidade não se esvai com a idade. Não podemos servir de massa de manobra. Exigimos respeito!

Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Nov.2021

danilosiliborges@gmail.com

O autor é membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÌLIA


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