MELHOR PREVENIR QUE LAMENTAR

 


 

Repito neste texto o mesmo título que atribuí ao documento final por mim elaborado, em 2011, como relator do grupo de trabalho criado pelo CREA-DF, sobre a necessidade das pontes, viadutos e outras obras públicas de porte serem sistematicamente vistoriadas e receberem manutenção.

Engenheiros do setor público, outros de entidades de representação profissional, alguns com mandatos de conselheiros do CREA estavam preocupados com a situação de deterioração de muitas pontes e viadutos em vias do DF, sendo que em certos casos as patologias estavam aparentes.

O relatório gerado apontou obras em situação crítica e deu, em carácter mais geral, sugestões para que sistematicamente o problema fosse colocado sob controle. Argumentou-se até que frente aos casos apontados, um eventual desastre repercutiria nas promoções para a Copa do Mundo que se organizava para 2014 com jogos previstos para Brasília, onde se planejava na ocasião a construção de um grande estádio. Infelizmente, o relatório solenemente entregue às autoridades distritais de então não produziram resultados práticos. Não custa lembrar que esse procedimento é prática nacional. O dedo aleatório do azar apontou para Belo Horizonte, onde um viaduto em construção desabou, produzindo vítimas fatais, durante a Copa de 2014, com repercussão internacional.

Os projetos de engenharia estrutural, os métodos construtivos, os materiais usados conferem às obras grande resistência e durabilidade. Elas resistem muito, muitas vezes além do que era de se esperar. O que leva, a nós engenheiros, numa chacota, a dizermos que “mais que os cães, o concreto é o melhor amigo do homem”. E por conta disso as autoridades (ir)responsáveis jogam com a sorte, mesmo sabendo dos riscos iminentes que lhes são alertados pelos técnicos. Rezam com devoção a pedir: “Que os viadutos e pontes em risco não caiam na minha gestão, valham-me os Deuses da Gravidade!” e pedem a intercessão de Sir Isaac Newton. Descobrem que rezas e mandingas às vezes falham e obras caem! E aí o único jeito é culpar os engenheiros e a engenharia.

Em 6 de fevereiro de 2018, parte do viaduto conhecido como o da Galeria dos Estados, desabou. Situado a poucos metros da Rodoviária do Plano Piloto, não custou vidas humanas, disseram então que “por sorte”. Eu me arriscaria a dizer, “por pouco azar, felizmente”. Sorte ou melhor previdência teria sido se algum tempo antes tivéssemos tido – os órgãos devidos do GDF, os de engenharia – os meios físicos e financeiros de fazer as intervenções para que o acidente não tivesse ocorrido. Sorte é atributo dos previdentes!

Meu avô, um simplório saloio português, teria dito: “quando a cabeça não pensa, paga o corpo”. Valeu o susto, o desconforto para a população e o alto custo do refazimento da obra, esse pago por todos nós, na dureza de impostos e taxas. Refazer é muito mais caro que dar manutenção.

Assustada, a população inquiria sobre o estado das obras similares. A imprensa recorria aos órgãos e entidades e ouviu sobre os muitos alertas que foram dados e que caíram no vazio.  Engenheiros e imprensa sabiam que era importante informar com cuidado para não criar pânico. Em maio, o Professor João Bosco Ribeiro, que por muitos anos ministrou a disciplina de Pontes na Universidade de Brasília, publicou artigo no Correio Braziliense, que indicava e reforçava as linhas mestras para uma ação governamental consistente de modo que viadutos e pontes do DF, fossem permanentemente cuidados.

Paralelamente, o professor Bosco apresentou ao Codese/DF, Conselho de Desenvolvimento Econômico, organização da Sociedade Civil, a proposta “Gestão de Pontes e Viadutos do DF”, que naquela altura formulava o documento Codese 2018-2030  “O DF QUE A GENTE QUER”. Aceita a proposta, criou-se no âmbito da entidade grupo de trabalho com participação ativa das instituições representativas dos engenheiros, do segmento empresarial, das instituições de ensino de engenharia.

O assunto levado ao Secretário de Obras Engenheiro Isídio Santos, engenheiro atuante na cidade, que consciente do problema, então no governo recém-empossado, designou o engenheiro Mauricio Canovas para integrar o GT.

Gestões bem conduzidas pelo Secretário de Obras levou a que o GDF baixasse o Decreto 39.849/2019, criando um conceito avançado para tratamento da questão dos viadutos e pontes do nosso território. O GT original ampliado passou a funcionar ao seu abrigo. Os mais de 700 viadutos e pontes foram cadastrados, todos com relatórios técnicos detalhados, seus riscos, necessidades de reparos, urgências foram encaminhadas para providências. A incorporação das Instituições de Ensino no processo mostrou o potencial para a formação de engenheiros especializados em recuperação estrutural.                                                                                                                                    

A pergunta é: e agora?

A experiência foi exitosa! É preciso consolidar o processo. O que os engenheiros, em defesa da incolumidade da sociedade, pleiteiam é a institucionalização de um sistema de gestão de riscos de obras públicas, com endereço certo e permanente, com pessoal técnico especializado, dotação orçamentária específica, capacidade de mobilização de meios que garantam a observação sistemática, o diagnóstico de patologias, a elaboração de projetos e a prescrição de medidas restauradoras, fiscalização do cumprimento do prescrito e a sinergia com as universidades que se mostraram tão úteis no que se pode chamar de  “programa piloto” realizado.

É preciso entender que os equipamentos urbanos e rodoviários são cada vez mais tecnologicamente sofisticados, exigindo uma política pública de Estado com meios adequados para que os cuidados - vistorias, manutenção e correções – sejam permanentes. Ignorados esses preceitos aumentam as probabilidades de ocorrências desastrosas.

Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Jun.2022

danilosiliborges@gmail.com

O autor é membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA

 

 

 


Comentários

  1. Nooosssa! Então em 2014, BH nos proporcionou o 7 a 1 duas vezes! Uma no futebol outra na Engenharia. Uai, sô!

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