O COMPROMISSO DEMOCRÁTICO
Da eleição-retorno de Getúlio em
1950, recordo-me do carnaval na Rua Visconde do Uruguay, em Niterói, da
marchinha que falava do “sorriso do velhinho” e do retrato que deveria ser
colocado no mesmo lugar, com referência ao que ocorrera em 1946, quando o
retrato de Getúlio presidente, havia sido retirado das paredes dos milhares de
repartições públicas de todo o país, onde haviam sido colocados, em um típico
culto à personalidade dos ditadores. Naquele carnaval de 1950, ouvi falar de
Getúlio e vi sua sorridente fotografia.
Já adolescente acompanhei atento
a crise que culminou com o suicídio de Vargas. Li jornais, ouvi transmissões
radiofônicas, fui à comícios. Pela primeira vez, senti a fragilidade da
democracia e como ela era incômoda a muitos participantes do jogo político.
Entre crises duradouras,
vi presidentes breves. O Vice Café Filho de 24/8/54 a 8/11/55. Carlos Luz, Presidente
da Câmara dos Deputados, em meio a uma crise político-militar, ostentou o
título por 72 horas. Naqueles dias, a democracia foi mesmo garantida pela espada
forte de um militar, Marechal Henrique Teixeira Lott, que impôs pela força a
posse de Juscelino, eleito em 1955, e fez valer a democracia ameaçada por quem
não a queria.
Cinco anos de respeito às
liberdades democráticas (1956 - 1960), crença fundamental de Kubitschek, parecia
que consolidaria o regime que nascera em 1946.
A inesperada renúncia de Jânio,
em 1961, solta nas ruas forças descompromissadas com a vontade popular, que
entram em embate. Há uma disputa no terreno ideológico e psicossocial que dura
longos meses. Parte da população é estimulada,
excitada e conduzida por suas lideranças a sentir-se ameaçada. Vai às ruas, faz
manifestos, pede por democracia e derruba o governo Goulart, que na tentativa
de manter-se, alinha-se com forças francamente autocráticas. Instala-se, no
vácuo do poder, um movimento militar que promete para breve a restauração da
democracia no País. Não foi o que ocorreu!
Voltei a votar para presidente da
república em 1989, vinte e sete anos depois da primeira vez. Eu tinha então 48
anos.
Há poucos dias o Brasil tomou
conhecimento de uma carta assinada por expressivas figuras da sociedade e da
sua intelectualidade em favor da democracia. Toda manifestação democrática é
bem-vinda para democratas de boa-fé, que acreditam nos princípios de eleições
universais, de pluralidade partidária, de liberdade de imprensa, de poderes
republicanos independentes, de liberdade econômica, de respeito às leis
instituídas.
No passado dia 16, iniciou-se
oficialmente a campanha eleitoral para as eleições de outubro, na qual, como é
óbvio, propostas político-ideológicas se apresentam aos eleitores. Espera-se
mesmo que ao longo dos próximos dias as campanhas se empenhem na elucidação das
suas alternativas para a solução dos impasses que dificultam o desenvolvimento
do país e não enveredem pelo inóspito terreno das agressões pessoais, que
exacerbam os ânimos das militâncias e descambam para um clima de intolerância e
agressividade que é tudo que está fora de um protocolo de convivência civilizada.
Sabemos que em todos os espectros
ideológicos existem as franjas radicais, em geral minoritárias, que sabendo-se
incapazes de sensibilizar a maioria dos eleitores, isto é, da população, para que
sejam eleitos, enquistam-se nos partidos, à espera de poderem golpear a
democracia e chegarem ao poder pela força ou por artifícios ardilosos. Com
frequência ouvimos declarações de líderes dessas facções neste sentido: “Não
precisamos de eleições para chegar ao poder”.
O que aqui quero ressaltar é que
os signatários da Carta pela Democracia o fizeram, desta vez, pelo temor de um
golpe a ser desferido supostamente pela Direita, tal como em 1964 movimentaram-se
por temor da Esquerda que dava suporte a Goulart. Sinais trocados, mas que permite
ler as similaridades.
Aos puros de coração, no passado como agora, o
compromisso é com a Democracia e esta não tem data de vencimento. Democratas o
são para sempre – como torcedores do Flamengo - e não irão apoiar um golpe caso
seu partido venha a ser alçado ao poder pelos mecanismos republicanos do voto
universal: imprensa livre, liberdade de opinião, combate a corrupção.
No passado, pôde-se identificar
os signatários ocasionais das cartas e manifestos de então.
Muitos foram os Democratas funcionais!
A Democracia é neutra, é como
água de fonte, inodora, sem cor e sem sabor. Não veste camisa de partidos. É disponível
aos justos, homens e mulheres de boa vontade, para levá-la aos oprimidos, aos que
tem sede e fome de justiça e de moralidade!
Crônicas da Madrugada. Danilo
Sili Borges. Brasília – Ago. 2022
O autor é membro da Academia
Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA
Recordar e viver. Nad a superar a xemocracia
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